9.14.2006

Quartos sem quadros

Do dia 13 ao dia 20 de Junho de 2004, estive deitada numa cama do hospital Santa Maria.


Sete dias fechada num quarto cinzento ou branco-sujo sem janelas.
Sete dias fechada entre quatro paredes que não me falavam. Nem respondiam.
Oito noites de cheiros de remédios e adormecida pelas vozes doridas dos doentes que também passavam os dias e as noites deitados em quartos cinzentos ou brancos-sujo sem janelas.
Durante uma semana não vi o contorno castanho dos galhos das árvores nem o contorno das folhas verdes no céu.
Durante uma semana os meus cabelos nunca me foram parar à boca com o vento. Nem uma vez fiquei com os cabelos cheios de nós por causa do vento.
Durante uma semana os meus olhos nunca se ressentiram com a luz do sol. Nem uma vez franzi a testa ou cerrei os olhos por causa da claridade. Durante uma semana os meus pés só sentiram o frio do lencol sem cor da cama do hospital ou o chao frio do hospital sem cor, quando me levavam da cama para a cadeira, ou quando eu ia da cadeira para a cama.
Quando saí do hospital, sete dias e oito noites depois de ter sido operada de urgencia ao ovário direito, cada pedacinho de normalidade se tinha transformado em felicidade.
Sou muito mais feliz agora.

19 Comments:

At quinta-feira, 14 setembro, 2006, Anonymous Anónimo said...

o q não me mata, torna-me mais forte.

Friedrich Nietzsche

 
At quinta-feira, 14 setembro, 2006, Anonymous Anónimo said...

«Your joy is your sorrow unmasked.

And the selfsame well from which your laughter rises was oftentimes filled with your tears.

And how else can it be?

The deeper that sorrow carves into your being, the more joy you can contain.

When you are joyous, look deep into your heart and you shall find it is only that which has given you sorrow that is giving you joy.

When you are sorrowful look again in your heart, and you shall see that in truth you are weeping for that which has been your delight.

Some of you say, "Joy is greater than sorrow," and others say, "Nay, sorrow is the greater."

But I say unto you, they are inseparable.

Together they come, and when one sits alone with you at your board, remember that the other is asleep upon your bed.»

Uma dádiva do poeta da tristeza que sempre me encheu de alegria. Inseparáveis, como na tua escrita. Inseparáveis, como a tua escrita em mim. Sempre.

 
At quinta-feira, 14 setembro, 2006, Blogger [ momentos ] said...

fizeste-me lembrar uma historia, penso que do almodovar, quando alguem descrevia o que via de uma janela de um quarto de hospital, enquanto o companheiro estava imobilizado numa cama, nos seus ultimos dias: contava historias das pessoas que passavam, das flores que cresciam, da paisagem distante... "pedacinhos de normalidade".
mas do outro lado da janela estava só um muro branco. mas foram, por certo, momentos menos infelizes assim.

 
At quinta-feira, 14 setembro, 2006, Blogger Z said...

Snark :) Tens razao, e o Friedrich também. Cresci muito. :)
E descobri que era mais forte do que pensava ser. Ganhei um conhecimento de mim totalmente sem par. :) Mark Twain diz que nunca nos acontece nada que nao sejamos capazes de suportar. Também é outro rapaz cheio de razao. :)
Beijinho grande.

 
At quinta-feira, 14 setembro, 2006, Blogger Z said...

Together they come, and when one sits alone with you at your board, remember that the other is asleep upon your bed. (...)

Lindo.
Obrigada, SL. Ainda me estas a dever o que escreveste, quero ler.

 
At quinta-feira, 14 setembro, 2006, Anonymous Anónimo said...

mas vê lá não cresças demais ok ;)
ainda te tornas num daqueles adultos e deixas de acreditar em fadas...

 
At quinta-feira, 14 setembro, 2006, Anonymous Anónimo said...

A minha mãe costuma dizer, Tudo o que nos acontece na vida é para a melhorar. Curioso é que só o diz quando algo corre mal.

(Estás em crescendo, em crescendo...)

 
At sexta-feira, 15 setembro, 2006, Anonymous Anónimo said...

odeio o Hospital Santa Maria!

a sua dimensão oprime-me

lembro-me em pequeno de ter partido uma clavícula e os meus pais andarem a andar comigo de um lado para o outro a vaguear por corredores sem fim

é um hospital de cidade grande, impessoal, onde és só mais um número e ninguém se lembra de ti

associo-o a Morte e a anonimato quando estás mais vulnerável
detesto-o :C

 
At sexta-feira, 15 setembro, 2006, Blogger Xana said...

Gosto tanto do que escreves. :)

 
At sábado, 16 setembro, 2006, Blogger Z said...

Snark, do not worry :) Kiss. :)

 
At sábado, 16 setembro, 2006, Blogger Z said...

Beijinhos (We), deve ser uma muito boa estória apesar de um bocado deprimente, essa do Almodovar. Beijinhos.

 
At sábado, 16 setembro, 2006, Blogger Z said...

Rsc, a tua mae será a minha mae? Seremos irmaos?
A minha diz a mesma coisa...

 
At sábado, 16 setembro, 2006, Blogger Z said...

Joaozinho, eu também odeio esse hospital. Depois de operados, em vez de ajudados os pacientes sao ignorados. Na sua grande maioria...

 
At sábado, 16 setembro, 2006, Blogger Z said...

Obrigada, Xana. :)
Lemos?

 
At segunda-feira, 18 setembro, 2006, Blogger rita said...

este blog cheira a canela, as letras são doces. vou voltar *

 
At terça-feira, 19 setembro, 2006, Blogger Z said...

Beijinho, Rita. :)

 
At segunda-feira, 25 setembro, 2006, Blogger SerendipityMan said...

Eu disse-te que temos coisas em comum, e não é só o Lobo...Tu estiveste no Sta. Maria 8 dias, eu tive na Prelada 8 meses a recuperar dum Síndrome de Guillain Barré. Sei bem o que é gostar da vida em toda a força da sua essência.Bj com letra grande.

 
At terça-feira, 26 setembro, 2006, Blogger Z said...

Meu Deus, S.
Guillain Barré.............. meu Deus.................................. FICO TAO CONTENTE POR ESTARES BEM AGORA................. Isso foi há quantos anos?
Beijinho.

 
At terça-feira, 19 dezembro, 2006, Blogger Joao Carmo Pereira said...

grande sof.

estou ctg! ainda relembro um ultimo concerto antes de uma intervenção desse genero. um dos melhores!

bjo,

johny

 

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